quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Apologia da Pequenez

[...] Fiz bem em ter horror
de à vista de todos levantar a cabeça, Mecenas,
glória dos cavaleiros.

A quanto mais se negar o Homem,
mais dos deuses receberá. Procuro nu as muralhas
dos que nada desejam, e anseio por deixar,
qual edesertor, as fileiras dos ricos.

Daquilo que desprezei, sou mais glorioso senhor
do que se a fama tivesse de esconder nos celeiros
tudo o que o infatigável Apúlio lavra,
um pobre entre tantas riquezas.

De pura água um ribeiro, de poucas jeiras um bosque,
e uma segura fé na minha colheita: tudo isso escapa
ao Homem que sobre a fértil África o seu poder irradia —
na sorte sou mais feliz.

E embora nem as abelhas da Calábria me tragam mel,
nem envelheça meu vinho nas ânforas dos Lestrígones,
nem cresçam para mim espessos velos
nos pastos da Gália,

de mim está longe a importuna pobreza,
e o que mais quisesse não te negarias a dar.
Retraindo o desejo faço melhor em esticar
o meu pequeno rendimento,

do que se unir o reino de Aliates aos campos
de Migdónia. Àqueles que muito pedem
muito falta. Está bem aquele a quem o deus
com frugal mão o suficiente doou.

Horácio, Odes 3.16
Cotovia, Lisboa: 2008. (trad.: Pedro Braga Flacão)

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