terça-feira, 14 de setembro de 2010

Invenções

Durante o seu [de Argos] reinado, foi esta honra [a divinização] atribuída a um simples particular fulminado por um raio, um certo Homogiro, o primeiro que atrelou bois ao arado.

[...qui honor eo regnante ante illum delatus est homini priuato et fulminato cuidam Homogyro, eo quod primus ad aratrum boues iunxerit.]

Santo Agostinho, Cidade de Deus, Livro XVIII, Cap. VI

Pode ter-se tudo isto como uma ficção poétia e asseverar-se que quem foi o pai de Pico foi Esterces, hábil agricultor que descobriu a maneira de fecundar os campos com o estrume dos animais, que, do seu nome, tomou o de esterco.

[Sed haec poetica opinentur esse figmenta et Pici patrem Stercen potius fuisse adseuerent, a quo peritissimo agricola inuentum ferunt, ut fimo animalium agri fecundarentur, quod ab eius nomine stercus est dictum]

Santo Agostinho, Cidade de Deus, Livro XVIII, Cap. XV
Gulbenkian, Lisboa: 1995. (trad.: J. Dias Pereira)

Se há coisa que me agrada nos antigos é o seu cuidado em, para quanto é útil na vida, inventar o seu inventor, por mais simples que seja a coisa, como nos dois exemplos que encimam o post. Sempre me custou — e não exagero no meu sentimento — não sabermos o nome, por exemplo, de quem descobriu a bolacha ou o iogurte, duas das criações gastrónimas que, pelo menos a meu ver, tornam a vida superiormente agradável. Acho também que é de ponderar uma estátua ao inventor das luvas ou do cachecol. Desprezamos em demasia os inventores (poucos saberão que Wittgenstein, por exemplo, desenhou um tipo de puxador de porta ainda hoje fabricado); os gregos, pelo contrário, divinizavam-nos, como Homogiro. Visto que luvas, cachecóis e iogurtes, tudo existia já pelo menos no tempo dos romanos, com um pouco de investigação, quiçá ainda descubro os inventores míticos de cada uma das coisas. Não deixarei, nesse caso, de lhes fazer justiça aqui, com um pequeno, mas sincero, post.

imagem: selo de Ícaro e o seu pai, Dédalo, o inventor-mor grego.

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