sábado, 8 de maio de 2010

Deslealdade

Ora nós, que elogiamos muita coisa em Homero, não louvaremos
uma [...] Nem Ésquilo, quando faz dizer a Tétis que Apolo, ao
cantar nos seus esponsais, exaltara a sua bela progénie,
de vida isenta de doenças e de longa duração,
Depois que anunciou que de tudo, no meu destino,
cuidariam os deuses,
entoou o péan para minha alegria.
Julgara eu que era sem dolo, de Febo
a boca imortal, plena de arte dos oráculos
E ele, o mesmo que cantou este hino[...]
[...]ele mesmo é que o matou,
esse filho que é meu.

Platão, República II (383a -b)



Quando casavam Tétis com Peleu
levantou-se Apolo no esplêndido festim
do casamento, e falou da ventura dos recém-casados
com o rebento que sairia da sua união.
Disse: A este nunca lhe tocará a doença
e terá vida longínqua. - Quando disse isto,
Tétis alegrou-se muito, pois as palavras
de Apolo que conhecia de profecias
lhe pareceram garantia para o seu filho.
E enquanto Aquiles crescia, e era
a sua beleza alarde da Tessália,
Tétis lembrava-se da palavra do deus.
Mas um dia chegaram velhos com notícias
e disseram a chacina de Aquiles em Tróia.
E Tétis rasgava a sua roupa púrpura,
e arrancava de cima de si e atirava
ao chão as pulseiras e os anéis.
E por entre seus prantos lembrou-se do passado;
e perguntou o que fazia o sábio Apolo
por onde andava o poeta que nos festins
maravilhosamente fala, por onde andava o profeta
quando matavam o seu filho na flor da vida.
E responderam-lhe os velhos que Apolo
ele próprio desceu a Tróia
e com os troianos matou Aquiles.



Konstandinos Kavafis, Os Poemas, Relógio D`Água, 2005
(Tradução, prefácio e notas de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratsinis)

Sem comentários:

Enviar um comentário