Quando recentemente tive de estudar as representações de amazonas ao longo dos séculos, desde os vasos gregos aos artistas contemporâneos, encontrei esta imagem, porque pronto me apaixonei. Talvez poucos se apercebam do carácter verdadeiramente invulgar da cena do quadro. Em toda a iconografia, este é muito possivelmente o único exemplo das amazonas despidas de toda a parafernália bélica. Para encontrarmos semelhante caso de humanização da figura da amazona, de um voluntário exercício por parte do artista de fazer descer estas mulheres do mito ao plano do real, do comum, da feminilidade quotidiana, será talvez preciso recuarmos até ao famoso kylix que dá o nome ao Pintor de Pentesileia:
Este kylix é certamente uma das obras mais perfeitas da pintura grega de vasos (tenho relatos de professores que choraram quando o viram em Munique, nas Staatliche Antikensammlungen und Glyptothek). Ao centro, Aquiles e Pentesileia, olhando-se, momento mirónico do pathos que o artista capturou. Note-se, porém, como a pintura é tudo menos uma representação realista da cena e isto por um detalhe apenas, mas fundamental: Pentesileia. A excepcionalidade da figura compreende-se tanto melhor quando a comparamos com a sua companheira morta, no lado direito. Esta encontra-se vestida à moda trácia, código grego para bárbaro. Pentesileia, contudo, aparece como uma rapariga normal que irrompe ali no campo de batalha como uma sabina sem filhos. Não tem um arco ou uma machadinha, as armas típicas das amazonas: encontra-se totalmente desprotegida. É uma mulher apenas, nova, bonita de se amar, a noiva que Aquiles poderia ter tido, como Nausícaa, não houvera Penélope, teria talvez sido a esposa de Ulisses.
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