domingo, 27 de junho de 2010

A Resposta Na Ponta da Língua

Conta Aulo Gélio, varão de elegantíssimo estilo e de vasta e profunda erudição, no seu livro que tem por título Noctes Atticae (Noites Áticas), que, certo dia, viajava no mar com um reputado filósofo estóico. Este filósofo, como mais larga e copiosamente refere Aulo Gélio e eu resumo aqui, ao ver o barco sacudido por um céu medonho e um mar perigosíssimo, devido ao medo começou a empalidecer. Isto foi notado pelos presentes, que, apesar da morte vizinha, curiosamente perguntavam se a alma de um filósofo se perturbaria. Depois, passada que foi a tempestade e quando a segurança deu aso à troca de impressões e mesmo de gracejos, um dos passageiros, faustoso rico asiático, increpou o filósofo por ter tido medo e empalidecido, ao passo que ele se manteve intrépido perante a morte iminente. Mas o outro contou-lhe a resposta do socrático Aristipo: este, ao ouvir, em iguais circunstâncias, as mesmas palavras de um indivíduo da mesma laia, respondeu-lhe que tinha feito muito bem em não se apoquentar com a vida de um velhaco, mas que devia recear pela vida de um Aristipo.

Santo Agostinho, Cidade de Deus, Livro IX, Cap. IV
Gulbenkian, Lisboa: 1993. (trad.: J. Dias Pereira)

[In libris, quibus titulus est Noctium Atticarum, scribit A. Gellius, uir elegantissimi eloquii et multae undecumque scientiae, se nauigasse aliquando cum quodam philosopho nobili Stoico. Is philosophus, sicut latius et uberius, quod ego breuiter adtingam, narrat A. Gellius, cum illud nauigium horribili caelo et mari periculosissime iactaretur, ui timoris expalluit. Id animaduersum est ab eis, qui aderant, quamuis in mortis uicinia curiosissime adtentis, utrum necne philosophus animo turbaretur. Deinde tempestate transacta mox ut securitas praebuit conloquendi uel etiam garriendi locum, quidam ex his, quos nauis illa portabat, diues luxuriosus Asiaticus philosophum compellat inludens, quod extimuisset atque palluisset, cum ipse mansisset intrepidus in eo quod inpendebat exitio. At ille Aristippi Socratici responsum rettulit, qui cum in re simili eadem uerba ab homine simili audisset, respondit illum pro anima nequissimi nebulonis merito non fuisse sollicitum, se autem pro Aristippi anima timere debuisse.]

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