sexta-feira, 25 de maio de 2012

Musique de la Grèce Antique

Apesar dos poderes imensos que os escritores antigos atribuem à música da Grécia Antiga, dotando-a de capacidades quase sobrenaturais para influenciar as índoles, a educação e a política dos que a ouviam, acontece que da totalidade dos fragmentos que sobreviveram (poucas dezenas todos eles compilados no Documents of Ancient Greek Music de Martin West), aqueles que ainda somos capazes de reproduzir apesar da sua decomposição não acolhem de muitos um entusiasmo por aí além. Numa das primeiras aulas duma cadeira online de História da Música, ao ser apresentado o fragmento chamado o Orestes Stasimon, comentou o professor que "isso não vai chegar ao top 50 do dia de ninguém". Também junto de professores late docti em termos quer de música como de literatura grega nunca encontrei grande recepção para estes fragmentos, que "não fazem, de longe, jus aos textos", servindo aparentemente apenas como desconfortável memória de que os juízos estéticos dos Gregos sobre a sua própria arte é por vezes um pouco distante da realidade (lembremo-nos das reconstruções dos pigmentos dos mármores do Parthénon, verdadeira experiência halucinogénica, ao mesmo tempo que ponderemos o curso da História da Arte providencialmente conduzido pela ephémera qualidade das tintas utilizadas em Athenas).


Eu não consegui jamais partilhar dessa opinião. Na mesma aula onde o Orestes Stasimon foi apresentado, apesar de já na altura eu já o conhecer, bateu-me de novo: estamos a ouvir os sons antigos, um espelho quebrado como um fragmento de Píndaro. Talvez tal se devesse às minhas pessoais deficiências na apreciação musical, pois que até ao dia não consigo discernir com precisão e honestidade se a minha admiração se deve àquele fascínio perante fragmentos tão inextricavelmente ligados à cultura da qual para mim tomei tanto, ao formido perante o archaico; ou se seria capaz de os admirar da mesma maneira se os houvesse encontrado segregados. Mostrou-me um professor no meu primeiro ano La Musique de la Grèce Antique, uma das mais conhecidas (mas não a única) recriação dos fragmentos, ousada porque quando quer que da partitura não sobreviveram troços fundamentais para uma coerência da música, novos foram escritos, drasticamente diferentes, assumidamente modernos mas nel stilo antico, opção desviada de outras reconstruções que toleram o vazio, que tornam presente a ausência infligida pelo tempo.




Um outro caminho é o duma gravação que conheci há poucos meses, Sappho and Her Time, que assumidamente com os fragmentos nada tem que ver. Antes, após reconstruirem a panóplia de instrumentos utilizados na época, tomaram vários poemas de Anacreonte, Sappho, Mimnermo, Simónides, Sólon, e Theógnis e musicaram-nos, em grego evidentemente. Não é por nem sequer existirem os fragmentos musicais correspondentes que o resultado não é archeológico: encontramos várias soluções como utilização de polyphonias vocais, assim como subidas e descidas súbitas de tom que acreditamos não tenham jamais feito parte do repertório. De certa forma o dilema aqui repete-se ao nível da música que se pôs desde o século XVI ao nível da música e do theatro. Como podemos repetir o aliciar da música antiqua? Quando a ópera tentou recriar a tragédia, não possuía ainda os fragmentos musicais, mas sabia que a ênfase teria de passar pela música (de modo que ao longo da sua história a grande tensão operática tenha sido: o que é mais importante, palavras ou música?). No nosso tempo temos já alguns, parcos fragmentos, e temos os instrumentos: temos também felizmente bastantes textos. Repete-se a tentação de recriar a  música, com algum sucesso, muito embora, ou graças a, todos os desvios: assombram-nos faixas como Psaphródita (baseada no famoso Hymno a Aphrodita de Sappho) ou Lýkos de Sólon.

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