sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Defesa Breve dos Deuses Pagãos

Há um certo discurso, com origem entre os pré-socráticos, retomado por Platão, e, mais tarde, muito aproveitado pelos Padres da Igreja (e ainda hoje ecoado — daí este pequeno post), segundo o qual a mitologia clássica exprime uma concepção primitiva do fenómeno divino, que os hebreus, dizem, teriam muito mais rapidamente superado, com a progressiva rarefacção da ideia de deus que se foi operando na sua cultura. Os deuses greco-romanos seriam deuses, à luz de Iavé e dos seus descendentes cristão e muçulmano, inaceitáveis: adúlteros, mentirosos, caprichosos. Já o monoteísmo teria cumulado deus com todas as perfeições, erigindo-o em modelo moral, daí a sua superioridade em termos do que poderíamos chamar a história da ideia de deus. O pecado capital da teologia pagã seria, assim, o da antropomorfização radical dos deuses (superior, apesar de tudo, ao teriomorfismo dos egípcios). Este discurso é, porém, contraditório, pois assenta ele mesmo numa lógica implícita de antropomorfização, ao querer submeter os deuses ao mesmo código moral que deve valer nas relações entre humanos, esquecendo a sentença de Heraclito: «para os deuses, todas as coisas são belas, boas e justas; os homens, porém, consideram injustas umas coisas e justas outras» (trad.: Alexandre Costa) [τῷ μὲν θεῷ καλὰ πάντα καὶ ἀγαθὰ καὶ δίκαια, ἄνθρωποι δὲ ἃ μὲν ἄδικα ὑπειλήφασιν, ἃ δὲ δίκαια] [B102].   

Midas & Medusa

com um agradecimento à Ália, que nos chamou a atenção para este divertido cartoon

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

π

(do baú das frases gregas cuja versão alemã já aqui tinha sido explorada)


ἀεὶ ὁ θεὸς γεωμετρεῖ
"God always geometrizes", Plato.

Plutarch elaborated on this phrase in his essay: Πῶς Πλάτων ἔλεγε τὸν θεὸν ἀεί γεωμετρεῖν "What is Plato’s meaning when he says that god always applies geometry" [No Banquete 8.2.1 = 718c]. Based on the above phrase of Plato, a present day mnemonic for π (pi) was derived:

ἀεὶ ὁ θεὸς ὁ μέγας γεωμετρεῖ τὸ σύμπαν :: Always the great God applies geometry to everything. 

π = 3.1415926... 
ἀεὶ - 3 letters
ὁ - 1 letter
θεὸς - 4 letters 
ὁ - 1 letter
μέγας - 5 letters
γεωμετρεῖ - 9 letters 
τὸ - 2 letters
σύμπαν - 6 letters

na quadra em que estamos não se rogam pragas

   20 Dezembro (segunda). Chove. Mas não interessa. O Natal vem aí e é preciso cumprir a obrigação de inventar a amizade e a cortesia e a ternura familiar. (...) sento-me aqui à procura não bem do ter que dizer, mas de uma maneira em que esse dizer seja outro no seu modo de ser o mesmo. É um pouco difícil, atravessado como estou de pragas contra o Natal. (...) na quadra em que estamos não se rogam pragas. Mas é só o que me apetece pela chuva e pelos embrulhos. Bom. Mas dizer o quê então? Não sei, coisas várias, restos de uma conversa de ontem com a Regina. Relia eu um pouco de latim, que me tem apetecido como as filhós da infância. E então pensei uma vez mais em como é enorme a distância de uma língua escrita à falada. A escrita é uma invenção da gramática, mais ou menos desvitalizada como uma múmia. A falada é orgânica, feita de sucos e gestos e cuspo e contracções do rosto e esquematismos verbais. Como imaginar numa página em latim a língua falada na rua, em família, na cama, entre vigaristas, entre os trapos da pobreza? Como imaginá-la no correntio da vida, fora da gramática e das regras da recta pronúncia? (...)
   E então pus-me a pensar numa invenção provável para daqui a quinhentos anos e já decerto visionada por um inventor no desemprego e imaginário sem responsabilidades. Aqui há anos os jornais noticiaram que na Itália um sujeito abriu a TV e com enorme surpresa sua captou uma emissão de há quatro anos. Os sinais emissores tiveram tempo de percorrer um largo espaço do cosmos e voltaram do passeio desses quatro anos. Como não conceber que os raios luminosos emitidos há séculos venham a ser captados um dia? Como não imaginar que os sinais sonoros igualmente venham a ser recuperados por uma máquina habilidosa? (...)
   É fácil assim prever que ao serão um maníaco historiográfico carregue num botão do aparelho e reveja a batalha de Aljubarrota ou a pregação de Cristo ou o assassinato de César. Será então possível recuperar uma língua já morta, ouvir de novo um discurso de Péricles ou de Cícero, ouvir as plebes romanas aglomeradas no circo ou no foro ou nas termas, ou na Via Ápia. (...)
   Tenho pena de já cá não estar. Mas é possível que então eu me sentisse privado da ignorância, dentro do saber de então, como hoje me sinto intrigado e fascinado por não ter conhecido o que não conheci, desde a Helena de Tróia à padeira de Aljubarrota.

Vergílio Ferreira, Conta- Corrente IV (1982-1983), Lisboa, Bertrand Editores, 1993, 191-192

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Sobre a Ideia de Progresso









Toda a ideia de progresso é contrariada pela existência da Ilíada. A perfeição do primeiro excerto torna ridícula a pretensão de ascensão progressiva. Mas a Ilíada é, ao mesmo tempo, uma acção provocatória em relação às formas, desafia-as e envolve-as num leque que deve ainda abrir-se. E isso precisamente graças à nitidez imperiosa com que do seu interior é excluído, e quase expulso, o que depois, durante séculos, se articularia na palavra. Aquele início perfeito evoca obstáculos ausentes, Mallarmé.

Roberto Calasso, As Núpcias de Cadmo e Harmonia, pg. 108 
Cotovia, Lisboa: 1990. (trad.: Maria Jorge Vilar de Figueiredo).

O Exemplo Que Faltava em Maquiavel

Sebastiano Ricci (1706-08), A Infância de Ciro @ Kunsthalle, Hamburgo
Esse estratagema com que os tiranos embrutecem os súbditos está, mais do que em qualquer outro lado, explicitado no que Ciro fez aos lídios, depois de se ter apoderado de Sardes, cidade capital da Lídia, e de ter aprisionado o riquíssimo rei Creso, levando-o cativo. Trouxeram-lhe a notícia de que os de Sardes se tinham revoltado, e ter-lhe-ia sido fácil dominá-los; mas, não desejando saquear uma tão bela cidade nem querendo destacar para lá um exército que a vigiasse, recorreu a um outro espantoso expediente. Fundou nela bordéis, tabernas e jogos públicos, mandando apregoar um decreto em que obrigava os habitantes a frequentá-los.

Tão bons resultados teve esta guarnição que foi desnecessário daí em diante levantar a espada contra os lídios. Os desgraçados divertiram-se a inventar toda a casta de jogos, de tal forma que a palavra latina usada para significar passatempo é a palavra ludi, que vem de Lydi (lídios)*. Nem todos os tiranos foram tão explícitos no seu desejo de tornarem os homens frouxos, mas o que este ordenou formalmente foi pela maior parte realizado de forma velada.

La Boétie, Discurso Sobre a Servidão Voluntária, pg. 42-3 
Antígona, Lisboa: 1997. (trad.: Manuel João Gomes)

*Tanto quanto sei, esta etimologia é falsa: os estudiosos dividem-se entre os que fazem ludus derivar do etrusco e os que remetem para a raiz proto-indoeuropeia *leid-, que significa brincar.

[Mais cette ruse de tyrans d’abêtir leurs sujets ne se peut pas connaître plus clairement que Cyrus fit envers les Lydiens, après qu’il se fut emparé de Sardis, la maîtresse ville de Lydie, et qu’il eut pris à merci Crésus, ce tant riche roi, et l’eut amené quand et soi : on lui apporta nouvelles que les Sardains s’étaient révoltés ; il les eut bientôt réduits sous sa main ; mais, ne voulant pas ni mettre à sac une tant belle ville, ni être toujours en peine d’y tenir une armée pour la garder, il s’avisa d’un grand expédient pour s’en assurer : il y établit des bordeaux, des tavernes et jeux publics, et fit publier une ordonnance que les habitants eussent à en faire état. Il se trouva si bien de cette garnison que jamais depuis contre les Lydiens il ne fallut tirer un coup d’épée. Ces pauvres et misérables gens s’amusèrent à inventer toutes sortes de jeux, si bien que les Latins en ont tiré leur mot, et ce que nous appelons passe-temps, ils l’appellent ludi, comme s’ils voulaient dire Lydi. Tous les tyrans n’ont pas ainsi déclarés exprès qu’ils voulsissent efféminer leurs gens ; mais, pour vrai, ce que celui ordonna formellement et en effet, sous main ils l’ont pourchassé la plupart.]

Falar Grego Antigo

(começa aos 0:30)
Quando acabei o curso, devo confessá-lo aqui, não era capaz de pegar num livro de Plutarco e lê-lo em Grego sem tradução e sem dicionário. Isto para dizer que, de certa maneira, a primeira coisa que salta à vista no estudo do Grego é o grande fracasso dos métodos tradicionais do ponto de vista dos seus resultados. Se dedicarmos o mesmo número de horas  à aprendizagem do inglês ou do francês conseguimos resultados vastamente superiores. - Cristophe Rico
Cristophe Rico é o famoso autor do livro de grego Polis: Parler le grec ancien comme une langue vivante (Cerf). Embora me incomode um pouco por ensinar a língua comum (Koinê), e não o Grego Clássico  é essa a razão principal pela qual continuo a optar pela ampliação italiana feita por Luigi Miraglia do manual Athenaze (Vivarium Novum Edizioni et alii) feita a partir da versão inglesa de Maurice Balmer,  adaptação essa por sinal bastante melhor do que a original inglesa — fora esse detalhe técnico simpatizo com ele a toda a linha contra os méthodos vulgarmente utilizados. Uma crítica na Amazon ao livro diz-nos «For people learning modern languages, this seems like a no brainer, but trust me, you have never seen a book on a "dead language" like Rico's.» - pelo menos nada escrito nos últimos 250 anos, acrescentaria eu. Alunos que aprendem línguas antigas (tudo isto vale quer para o Grego quer para o Latim) pela primeira vez com méthodos vivos não só se espantam que se possa aprender de outra maneira, como também (ao contrário dos seus pares que as aprendem tradicionalmente, para os quais que o ensino possa ser diferente é também motivo de estupefacção) atingem por regra graus de proficiência notavelmente superiores. Tudo isto são coisas de que já aqui falei.

Mas oportet ouvi-las iterum iterumque. Qualquer pessoa que conheça os dois lados da questão reconhece qual o mais bem-sucedido, agora o futuro ou a sua condenação depende daqueles que efectivamente dão as cartas: os professores do secundário, os professores universitário, cujo vasto conhecimento passivo das línguas se poderá transformar em conhecimento activo desde que estejam dispostos a esforçar-se para o aprender, com proveitos colossais para os seus futuros alunos. Por vezes lamentamo-nos (em Portugal, onde o ensino das línguas antigas se passou a iniciar apenas na universidade) que "agora", visto que já não se parte com bases do secundário, é "impossível" obter os mesmos resultados que antigamente, ignorando o facto de a diferença, embora existente, não é qualitativamente superior; resultados muito melhores que os "de antigamente" poderão ser atingidos, desde que se ouse enfrentar o ovo de Colombo de que podemos ensinar e aprender estas línguas de maneira diferente. Τοὐλάχιστον δὴ τοῦτ' ἐλπίζ' ὲγώ!

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Philologias Natalícias dum Leitor Bilingue

Hoje por ser Natal resolvi ler as narrativas da Natividade presentes nos Evangelhos (não em todos, está por exemplo ausente em S. Marcos, e em S. João aparece apenas na forma lacónica com que Vos saudámos há 2 anos atrás). Peguei na minha edição bilingue Greco-Latina de Gianfranco Nolli, que contem uma edição crítica grega juntamente com a edição latina vulgarmente chamada a Nova Vulgata, sendo uma reedição do texto latino que circulou até ao século XX. Pelo que ouço, a Nova Vulgata resolve vários problemas a nível textual, mas foi aquando da sua criação (e mesmo ainda hoje) criticada por aqueles para quem o texto latino, porquanto seja uma tradução, adquiriu ele próprio o estatuto sacral que seria num contexto normal reservado à versão original, numa situação análoga encontramos a edição dos 70 na comunidade judaica da Antiguidade, ou a Authorized Version nas comunidades anglófonas; no que à Vulgata diz respeito, esta ideologia remonta à crítica protestante da fixação cathólica pelo texto latino, chegando-se ao ponto de as traduções cathólicas da Idade Moderna se gabarem de serem feitas a partir do texto latino, mesmo em casos em que os tradutores conhecessem o grego e o hebraico - é o caso da dita Bíblia Douai-Rheims.

Estou porém infelizmente muy longe de me poder gabar de conhecer as ramificações paralelas das diversas traduções bíblicas, mesmo ficando-me pelas versões gregas ou por estas duas versões latinas, digo a Vulgata e a Nova Vulgata. Hoje no entanto quanto como dizia lia as narrativas natalícias, reparei junto de S. Lucas que a tradução latina do hymno de louvor dos anjos Δόξα ἐν ὑψίστοις θεῷ [Glória a Deus nas alturas] aparecia traduzido como Gloria in altissimis deo. Familiarizado como estou com o famosa formulação do versículo enquanto Gloria in excelsis deo [Glória a Deus nas alturas], a minha primeira reacção foi a típica ignorância boçal de lamentar que a revisão da Nova Vulgata tivesse 'deturpado' uma versão tão consagrada quanto o era o excelsis antigo, ainda para mais quando a diferença entre ela e altissimis não é virtualmente nenhuma, e ὑψίστοις traduz ambos sem qualquer penalização semântica.

Decidi assim confirmar. Há duas grandes versões da Vulgata Latina, ou duas grandes edições, a mais importante é a Vulgata Clementina, nascida dos esforços da contra-reforma, que, como os seus inimigos protestantes, pôs a bom uso todo o aparato da imprensa para fins de propaganda religiosa, resultou na uniformização das diferenças apesar de tudo ainda existentes entre edições. A outra é a Bíblia de Stuttgart, uma edição crítica do texto latino, ateando-se a ele mais do que a uma tradução fiel dos textos gregos ou hebraicos. Conferi ambas, e não é que ambas me devolviam a versão Gloria in altissimis? Para confundir ainda mais, algures  antes o texto do evangelho que o antecede reza Ecce enim evangelizo vobis gaudium magnum, que eu na mixórdia em que versava a minha cabeça já começara a emparelhar a um outro, Nuntio vobis gaudium magnum, com o resultado de pensar que também essa alteração se deveria a uma alteração textual da tradução. Como porém reconciliar esse facto com a situação em que o texto latino se apresentava idêntico para o que interessa nas três versões?

A solução apareceu em breve, um elegante desnodar dos problemas que teve como principal resultado aquela conclusão com a qual se não estivesse já habituado a ela teria diariamente problemas, um exercício de prática de humildade intelectual, que é um euphemismo para dizer um atestato de estupidez auto-passado: coalescera três textos para resultar na confusão final. O primeira era realmente o texto bíblico das três versões acima-citadas, "Ecce enim evangelizo vobis gaudium maximum [...] Gloria in altissimis Deo." O Segundo era o anúncio da eleição papal, esse sim com a fórmula de Nuntio vobis magnum magnum (aqui as más-línguas poderiam apontar que quem quer que escreveu esta formulação poderia muito bem ter em mente fazer ressoar o eco entre as duas passagens, entre a vinda do Christo e a do seu Vicário). O terceiro e último, a chave-mestra do enigma, é que o hymno a que fazia referência e que tem o incipit por Gloria in excelsis Deo na realidade não é modelado no texto latino das Vulgadas mas sim antecede-o, sendo uma tradução anterior à de S. Jerónimo levada a cabo pelo Doutor da Igreja S. Hilário de Poitiers; a versão dele a partir do grego, essa sim, segue Gloria in excelsis Deo, sendo que essa tradução faz parte do conhecido cântico, anterior como dizia a Jerónimo. Os dois textos, de Jerónimo e de Hilário, floresceram paralelamente através dos tempos, e foram hoje motivo de intriga.

Tradutor Acrescentador


A Origem da Comédia deseja a todos os seus leitores um feliz Natal.
Obrigado pela vossa fidelidade, que nos dá o ânimo para continuar.

ἐν μέσῳ δύο ζῴων γνωσϑήσῃ [...] ἐν τῷ παρεῖναι τὸν καιρὸν ἀναδειχϑήσῃ.
No meio de dois animais, serás conhecido; [...] quando for a hora, aparecerás.

Habacuc 3, 2
(esta parte do versículo, apropriadamente para este blogue de coisas clássicas,
é exclusiva da versão grega dos Setenta, não se encontrando no original)

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Uma História de Amor


Catena Aurea

Hércules olhando a estátua do Pai
Experimentai, pois, ó deuses, para que todos saibais!
Do céu pendurai uma corrente feita de ouro
e agarrai nela, ó deuses todos e deuses todas!
Mas não arrastaríeis do céu para a planície terrena
Zeus, o sublime conselheiro, ainda que vos esforçásseis.
Porém no momento em que eu quisesse puxá-la,
arrastaria a própria terra e o próprio mar;
e de seguida ataria a corrente à volta do cume do Olimpo,
e todas as coisas ficariam suspensas no espaço:
em tal medida sou superior aos deuses e aos homens.

[εἰ δ᾽ ἄγε πειρήσασθε θεοὶ ἵνα εἴδετε πάντες: 
σειρὴν χρυσείην ἐξ οὐρανόθεν κρεμάσαντες 
πάντές τ᾽ ἐξάπτεσθε θεοὶ πᾶσαί τε θέαιναι: 
ἀλλ᾽ οὐκ ἂν ἐρύσαιτ᾽ ἐξ οὐρανόθεν πεδίον δὲ 
Ζῆν᾽ ὕπατον μήστωρ᾽, οὐδ᾽ εἰ μάλα πολλὰ κάμοιτε. 
ἀλλ᾽ ὅτε δὴ καὶ ἐγὼ πρόφρων ἐθέλοιμι ἐρύσσαι, 
αὐτῇ κεν γαίῃ ἐρύσαιμ᾽ αὐτῇ τε θαλάσσῃ: 
σειρὴν μέν κεν ἔπειτα περὶ ῥίον Οὐλύμποιο 
δησαίμην, τὰ δέ κ᾽ αὖτε μετήορα πάντα γένοιτο. 
τόσσον ἐγὼ περί τ᾽ εἰμὶ θεῶν περί τ᾽ εἴμ᾽ ἀνθρώπων.] 

Ilíada 8.18-27
Cotovia, Lisboa: 2005. (trad.: Frederico Lourenço)
*
Parece à primeira vista incrível, mas é a verdade: são sempre quatro ou cinco os que estão no segredo do tirano, são esses quatro ou cinco que sujeitam o povo à servidão. [...] Tal é a influência destes poucos sobre o caudilho que o povo tem de sofrer não só a maldade deste como também a deles. Essa meia dúzia tem ao seu serviço mais seiscentos que procedem com eles como eles procedem com o tirano. Abaixo destes seiscentos há seis mil devidamente ensinados a quem confiam ora o governo das províncias ora a administração dos dinheiros... [...]. E abaixo de todos estes vêm outros. Quem queira desenredar esta complexa meada descobrirá abaixo dos tais seis mil mais cem mim e milhões agarrados à corda do tirano; tal como em Homero Júpiter se gloria de que, puxando a corda, todos os deuses virão atrás.

[On ne le croira pas du premier coup, mais certes il est vrai: ce sont toujours quatre ou cinq qui maintiennent le tyran, quatre ou cinq qui tiennent tout le pays en servage. [...] Ces six adressent si bien leur chef, qu’il faut, pour la société, qu’il soit méchant, non pas seulement par ses méchancetés, mais encore des leurs. Ces six ont six cents qui profitent sous eux, et font de leurs six cents ce que les six font au tyran. Ces six cents en tiennent sous eux six mille, qu’ils ont élevé en état, auxquels ils font donner ou le gouvernement des provinces, ou le maniement des deniers,... [...]. Grande est la suite qui vient après cela, et qui voudra s’amuser à dévider ce filet, il verra que, non pas les six mille, mais les cent mille, mais les millions, par cette corde, se tiennent au tyran, s’aident d’icelle comme, en Homère, Jupiter qui se vante, s’il tire la chaîne, d’emmener vers soi tous les dieux.]

La Boétie, Discurso Sobre a Servidão Voluntária, pg. 50-51
Antígona, Lisboa: 1997. (trad.: Manuel João Gomes)
*
Subindo a escada em caracol no interior do templo, podia chegar-se às galerias superiores e daí observar de perto o Zeus de Fídias. Segundo Quintiliano, essa obra «acrescentara algo à religião dos homens». O ouro e o marfim alternavam apenas com pedras preciosas, excepto no trono onde também aparecia o ébano. Zeus estava cingido por uma coroa de oliveira e tinha na mão direita uma Nike com uma fita e uma coroa. Na base do trono havia outras pequenas Nike, como elfos dançantes. E também se viam Esfinges aladas arrebatando nas suas garras donzelas tebanas, e Apolo e Artemusa, trespassando, mais uma vez, os filhos de Níobe. E os olhos, habituando-se à escuridão animada, vislumbravam sempre novas cenas, esculpidas nas traves do trono. Quanto mais para baixo se olhava, mais se multiplicavam as figuras. Só na base do trono havia vinte e nove, as Amazonas, Héracles com as suas tropas e Teseu. Um rapaz ajusta uma fita na fronte: será Pantarques, o jovem amante de Fídias? Vedações pintadas, onde se vêem de novo Teseu e Héracles, depois Pirito, Ájax, Cassandra, Hipodamia, Estérope, Prometeu, Pentesileia, Aquiles e duas Hespérides, impedem o acesso ao trono. Na parte superior, surgem novos seres: três Cáritas e três Horas. Depois, o olhar volta a inclinar-se para o escabelo, fixando-se no pé de Zeus, e até aí encontra figuras: Teseu, mais uma vez, e de novo as Amazonas e leões de ouro. Continuando a descer com os olhos até à plataforma que sustenta o enorme Zeus e os seus parasitas, outras cenas se distinguem: Hélios subindo para o seu carro, Hermes avançando, seguido por Héstia, Eros recebendo Afrodite saindo das águas e sendo coroada por Peito. Não faltam Apolo e Artemisa, Atena e Héracles, Anfitrite e Posídon, e Selene, sobre um cavalo. Zeus, gigante sentado e incrustado de criaturas, reflectia-se num pavimento de pedra negra e brilhante, onde o óleo para a manutenção do marfim escorria em abundância. 

[...] Os modernos mostraram-se receosos e perplexos perante as descrições. Demasiadas cores, demasiado fausto oriental, a suspeita de uma certa falta de gosto. Terá Fídias, na sua obra mais ambiciosa, perdido todas as qualidades que se admiram nos frisos do Parténon? O erro dos modernos é considerarem o Zeus de Fídias uma estátua, como o Hermes de Praxíteles. O Zeus de Fídias, porém, era outra coisa. Encerrado e fulgurante na cela do templo, talvez se assemelhasse mais a um dólmen, a um abadir, a uma pedra caída do céu, a que se tivessem agarrado, para viver, os outros deuses e heróis. Sobre o ouro e marfim pululava o movimento de um formigueiro. Zeus não susbstiria senão como suporte de animais e de lírios, de arcos e panejamentos, de velhas cenas eternamente repetidas. Mas Zeus não era apenas aquele guardião imóvel sentado no trono: Zeus era todas aquelas cenas, todos aqueles gestos, confusos e emaranhados, que lhe eriçavam o corpo e o trono com arrepios minúculos. Fídias demonstrara, sem querer, que Zeus não pode viver sozinho: mostrara, sem querer, a essência do politeísmo. 

Roberto Calasso, As Núpcias de Cadmo e Harmonia, pg. 169-171 
Cotovia, Lisboa: 1990. (trad.: Maria Jorge Vilar de Figueiredo)

domingo, 23 de dezembro de 2012

Leitores Atentos §16

Guercino, Aurora (1621) @ Casino Ludovico, Roma
Esta noite, ainda antes do amanhecer, Hipócrates, filho de Apolodoro e irmão de Fáson, bateu com o bastão na minha porta, com toda a força e, quando lha abriram, precipitou-se imediatamente para o interior, a gritar, com voz forte:
- Sócrates, já acordaste ou ainda dormes?
E eu, reconhecendo-lhe a voz, exclamei:
- É Hipócrates! Não me vens trazer nenhuma má notícia, pois não?
- Não - respondeu ele. - Nada senão boas notícias.
- Diz lá, então - repliquei eu. - O que há? A que propósito vieste cá a esta hora?
- Chegou Protágoras! - respondeu ele, de pé junto de mim.

[τῆς γὰρ παρελθούσης νυκτὸς ταυτησί, ἔτι βαθέος ὄρθρου, Ἱπποκράτης, ὁ Ἀπολλοδώρου ὑὸς Φάσωνος δὲ ἀδελφός, τὴν θύραν τῇ βακτηρίᾳ πάνυ σφόδρα ἔκρουε, καὶ ἐπειδὴ αὐτῷ ἀνέῳξέ τις, εὐθὺς εἴσω ᾔει ἐπειγόμενος, καὶ τῇ φωνῇ μέγα λέγων, ‘ὦ Σώκρατες,’ ἔφη, ‘ἐγρήγορας ἢ καθεύδεις;’ καὶ ἐγὼ τὴν φωνὴν γνοὺς αὐτοῦ, ‘Ἱπποκράτης,’ ἔφην, ‘οὗτος: μή τι νεώτερον ἀγγέλλεις;’ ‘οὐδέν γ᾽,’ ἦ δ᾽ ὅς, ‘εἰ μὴ ἀγαθά γε.’ ‘εὖ ἂν λέγοις,’ ἦν δ᾽ ἐγώ: ‘ἔστι δὲ τί, καὶ τοῦ ἕνεκα τηνικάδε ἀφίκου;’ ‘Πρωταγόρας,’ ἔφη, ‘ἥκει,’ στὰς παρ᾽ ἐμοί.]

Platão, Protágoras 310a-b 
Relógio d' Água, Lisboa: 1999. (trad.: Ana Elias Pinheiro).
*
Se vires alguém sensato, madruga e vai ter com ele,
e desgastem os teus pés o limiar da sua porta.
[ἐὰν ἴδῃς συνετόν, ὄρϑριζε πρὸς αὐτόν, 
καὶ βαϑμοὺς ϑυρῶν αὐτοῦ ἐκτριβέτω ὁ πούς σου.]

Sir 6, 36, retirado da Nova Bíblia dos Capuchinhos.
Difusora Bíblica, Lisboa/Fátima: 1998. (trad.: Arlindo Gomes Furtado)

Especulava Agostinho que Platão teria lido os Profetas [Cidade de Deus 8.11]; aqui é caso para imaginar o inverso: que Jesus (não o Cristo, mas o Filho de Sirá, de onde o nome do livro: Ben [filho, em hebraico] Sirá) terá contactado com o corpus platónico, o que é assaz plausível, dado o ambiente cultural, fortemente helenizado, em que a obra, do primeiro quartel do século II a.C., surge. A título de curiosidade, há um versículo do livro da Sabedoria (escrito em Alexandria, algures entre 150 e 50 a.C.) que recupera a mesma imagem da madrugada: «Quem por ela [sabedoria] madruga não se cansará» [ὁ ὀρϑρίσας πρὸς αὐτὴν οὐ κοπιάσει] [6, 14].

Hegel lê tudo isto e torce o nariz: «Quando as sombras da noite começam a cair é que levanta o voo o pássaro de Minerva» [Die Eule der Minerva beginnt erst mit der einbrechenden Dämmerung ihren Flug] [Princípios da Filofia do Direito, pg. 16 (trad.: Orlando Vitorino)]. Os outros respondem-lhe: pois é precisamente quando o mocho regressa a casa, ao amanhecer, que o devemos apanhar, quando ele vem inchado do que aprendeu de/da noite.

Do Valor do Original

...μούνην γὰρ κραδίην νοερὴν λίπον...
...deixaram apenas o «coração pensante»*...
Fragmentos Órficos 210a Kern
*usamos a tradução de Calasso, em As Núpcias... [p. 295],
 que foi quem nos deu a descobrir o fragmento.

διαβούλιον καὶ γλῶσσαν καὶ ὀϕϑαλμούς,
ὦτα καὶ καρδίαν ἔδωκεν διανοεῖσϑαι αὐτοῖς.
[Deus] Dotou-os de inteligência, língua e olhos,
de ouvidos e dum coração para pensar.
Sir 17, 6, retirado da Nova Bíblia dos Capuchinhos
Difusora Bíblica, Lisboa/Fátima: 1998. (trad.: Arlindo Gomes Furtado)

Só ao fazer este post me apercebi da (parcial) falsidade da ligação que pensava existir entre os dois textos, que li com poucos dias de diferença, primeiro o último. A expressão «um coração para pensar» obrigou-me, na altura, a parar, parecendo resumir em si todo um programa para uma filosofia nova e sobretudo necessária, que leve a sério o desejo, a relação & os afectos. Pouco me importava que a nota esclarecesse que, para os hebreus, o coração era a sede do pensamento e que, portanto, a frase nada tinha de extraordinário: o que me interessava era o paradoxo que o tempo ali operara, e a sua potência. Ao ver agora o texto grego, percebo que entendi mal o texto: o «para pensar» refere-se não exclusivamente ao coração mas a todos os órgãos antes listados, como deixa claro a tradução do King James: «Counsel, and a tongue, and eyes, ears, and a heart, gave he them to understand». E eu que entretanto até já publicitara a expressão «um coração para pensar» junto de um amiga. Valham-nos pois os gregos e Proclo, que nos salvou, como Atena o de Zagreu (a quem se refere o fragmento), esse «coração pensante», para alimentar a contemplação & a luz.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Sobre a Autoridade dos Antigos

The skull of Sir Thomas Browne resting on two volumes of Religio Me­dici
BUT the mortallest enemy unto Knowledge, and that which hath done the greatest execution upon truth, hath been a peremptory adhesion unto Authority, and more especially, the establishing of our belief upon the dictates of Antiquity. [...] Now hereby methinks we manifestly delude our selves, and widely walk out of the track of Truth.

For first, Men hereby impose a Thraldom on their Times, which the ingenuity of no Age should endure, or indeed, the presumption of any did ever yet enjoyn. Thus Hippocrates about 2000 years ago, conceived it no injustice, either to examine or refute the Doctrines of his Predecessors: Galen the like, and Aristotle the most of any. [...]

Secondly, Men that adore times past, consider not that those times were once present; that is, as our own are at this instant, and we our selves unto those to come, as they unto us at present, as we relye on them, even so will those on us, and magnifie us hereafter, who at present condemn our selves. Which very absurdity is daily committed amongst us, even in the esteem and censure of our own times. And to speak impartially, old Men, from whom we should expect the greatest example of Wisdom, do most exceed in this point of folly; commending the days of their youth, which they scarce remember, at least well understood not; extolling those times their younger years have heard their Fathers condemn, and condemning those times the gray heads of their posterity shall commend. And thus is it the humour of many heads, to extol the days of their Fore-fathers, and declaim against the wickedness of times present. Which notwithstanding they cannot handsomly do, without the borrowed help and Satyrs of times past; condemning the vices of their own times, by the expressions of vices in times which they commend; which cannot but argue the community of vice in both. Horace therefore, and Juvenal, and Persius were no Prophets, although their lines did seem to indigitate and point at our times. There is a certain list of vices committed in all Ages, and declaimed against by all Authors, which will last as long as human nature; which digested into common places, may serve for any Theme, and never be out of date until Dooms-day.

Thirdly, The Testimonies of Antiquity, and such as pass oraculously amongst us, were not, if we consider them, always so exact, as to examine the doctrine they delivered. For some, and those the acutest of them, have left unto us many things of falsity; controlable, not only by critical and collective reason, but common and Country observation. [...]

Other Authors write often dubiously, even in matters wherein is expected a strict and definitive truth; extenuating their affirmations, with aiunt, ferunt, fortasse: as Diascorides, Galen, Aristotle, and many more. Others by hear-say; taking upon trust most they have delivered, whose Volumes are meer Collections, drawn from the mouths or leaves of other Authors; as may be observed in Plinie, Elian, Athenæus, and many more. Not a few transcriptively, subscribing their Names unto other mens endeavours, and meerly transcribing almost all they have written. [...]

Fifthly, We applaud many things delivered by the Ancients, which are in themselves but ordinary, and come short of our own Conceptions. Thus we usually extol, and our Orations cannot escape the sayings of the wise men of Greece. Nosce teipsum, of Thales: Nosce tempus, of Pittacus: Nihil nimis, of Cleobulus; which notwithstanding to speak indifferently, are but vulgar precepts in Morality, carrying with them nothing above the line, or beyond the extemporary sententiosity of common conceits with us. Thus we magnifie the Apothegms or reputed replies of Wisdom, whereof many are to be seen in Laertius, more in Lycosthenes, not a few in the second Book of Macrobius, in the sals of Cicero, Augustus, and the Comical wits of those times: in most whereof there is not much to admire, and are methinks exceeded, not only in the replies of wise men, but the passages of society, and urbanities of our times. And thus we extol their Adages, or Proverbs; and Erasmus hath taken great pains to make collections of them, whereof notwithstanding, the greater part will, I believe, unto indifferent Judges be esteemed no extraordinaries; and may be parallel'd, if not exceeded, by those of more unlearned Nations, and many of our own.

Sixthly, We urge Authorities in points that need not, and introduce the testimony of ancient Writers, to confirm things evidently believed, and whereto no reasonable hearer but would assent without them; such as are, Nemo mortalium omnibus horis sapit. Virtute nil præstantius, nil pulchrius. Omnia vincit amor. Præclarum quiddam veritas. All which, although things known and vulgar, are frequently urged by many men, and though trivial verities in our mouths, yet, noted from Plato, Ovid, or Cicero, they become reputed elegancies. For many hundred to instance but in one we meet with while we are writing. Antonius Guevera, that elegant Spaniard, in his Book entituled, The Dial of Princes, beginneth his Epistle thus: «Apolonius Thyaneus, disputing with the Scholars of Hiarchas, said, that among all the affections of nature, nothing was more natural, then the desire all have to preserve life». Which being a confessed Truth, and a verity acknowledged by all, it was a superfluous affectation to derive its Authority from Apolonius, or seek a confirmation thereof as far as India, and the learned Scholars of Hiarchas. [...] 'Tis sure a Practice that savours much of Pedantry; a reserve of Puerility we have not shaken off from School; where being seasoned with Minor sentences, by a neglect of higher Enquiries, they prescribe upon our riper ears, and are never worn but with our memories.

Lastly, While we so devoutly adhere unto Antiquity in some things, we do not consider we have deserted them in several others. For they indeed have not onely been imperfect, in the conceit of some things, but either ignorant or erroneous in many more. [...] They conceived the torrid Zone unhabitable, and so made frustrate the goodliest part of the Earth. But we now know 'tis very well empeopled, and the habitation thereof esteemed so happy, that some have made it the proper seat of Paradise; and been so far from judging it unhabitable, that they have made it the first habitation of all. [...] Having thus totally relinquisht them in some things, it may not be presumptuous, to examine them in others: but surely most unreasonable to adhere to them in all, as though they were infallible, or could not err in any.

Thomas Browne, Pseudodoxia Epidemica (1646; 6th ed.: 1672), or 
Enquries into very many received tenets and commonly presumed truths, Cap. VI

Aussi Bonne Grâce








Para o Miguel

Xenofonte, historiador sério e da melhor água entre os gregos, fez um livro em que pôs Simónides a falar com Hiéron, rei de Siracusa, sobre as misérias dos tiranos. É um livro cheio de bons e graves argumentos e, a meu ver, com muita graça.

Xénophon, historien grave et du premier rang entre les Grecs, a fait un livre auquel il fait parler Simonide avec Hiéron, tyran de Syracuse, des misères du tyran. Ce livre est plein de bonnes et graves remontrances, et qui ont aussi bonne grâce, à mon avis, qu’il est possible.

La Boétie, Discurso Sobre a Servidão Voluntária, pg. 41
Antígona, Lisboa: 1997. (trad.: Manuel João Gomes)

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Tέλος

A certa altura da sua história, quando todos os palácios tinham sido incendiados e já não se via o ouro, a certa altura da sua história de que bem pouco sabemos, porque não nos foram deixados nem palavras nem monumentos, os Gregos optaram pela perfeição em detrimento do poder. O poder sonha com uma expansão indefinida, a perfeição não pode sonhar. O perfeito é apenas um entre os inúmeros pontos do processo que transforma constantemente a existência. Mas este ponto tem um defeito oculto, que aterroriza os Gregos: o ponto perfeito é aquele que conclui, que mata. 

Roberto Calasso, As Núpcias de Cadmo e Harmonia, pg. 238
Cotovia, Lisboa: 1990. (trad.: Maria Jorge Vilar de Figueiredo).

O Amor Picado Por Uma Abelha

Albrecht Dürer, Cupid the Honey Thief [roubado aqui]
Eros, certa vez, entre rosas
uma abelha adormecida
calhou não ver e foi picado.
Com o dedo ferido
da mão se pôs a gritar,
e a toda a pressa esvoaçou
para junto da bela Citereia:
“Estou perdido, mãe! – dizia –,
estou perdido e às portas da morte!
Uma serpente me mordeu, pequenina,
dessas com asas a que chamam
abelha os agricultores.”
Ela lhe respondeu: “Se o ferrão
te magoa, o de uma abelha,
quanto julgas tu que magoas,
Eros, aqueles que tu atinges?

[Ἔρως ποτ’ ἐν ῥόδοισι/ κοιμωμένην μέλιτταν/ οὐκ εἶδεν, ἀλλ’ ἐτρώθη./ τὸν δάκτυλον παταχθείς/ τᾶς χειρὸς ὠλόλυξε,/ δραμὼν δὲ καὶ πετασθείς/ πρὸς τὴν καλὴν Κυθήρην/ ’ὄλωλα, μῆτερ,’ εἶπεν,/ ’ὄλωλα κἀποθνήσκω·/ ὄφις μ’ ἔτυψε μικρός/ πτερωτός, ὃν καλοῦσιν/ μέλιτταν οἱ γεωργοί.’/ ἃ δ’ εἶπεν· ‘εἰ τὸ κέντρον/ πονεῖς τὸ τᾶς μελίττας,/ πόσον δοκεῖς πονοῦσιν,/ Ἔρως, ὅσους σὺ βάλλεις;’]

Anacreontea 35 
Fluir Perene, Coimbra: 2009 (trad.: Carlos Jesus). [online aqui].

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Rafael Theólogo, Rafael Pagão

Rafael: os philósophos da Escola de Athenas - face a face aos theólogos da Disputa sobre o Sacramento. Arquitectura da História, Theologia da Arquitectura. A razão pagã diante da graça que interrompe, que auncia o momento do fim, e no meio da seta do tempo — nós.

Pagans in the Church. Stanford University.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Valha-nos São Platão!

In [unsophisticated monastic circles] Plato and Aristotle, with Plutarch not far behind, ranked with the prophets. You can see them painted in chapels on Mount Athos or on Orthodox churches in Moldavia. […] The Tree of Jesse on the outside wall of churches such as Sucevitsa often includes Thucydides, Plutarch, and even Porphyry.

Steven Runciman. The Last Byzantine Renaissance. Cambridge University Press (1970).

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Novidades Classica Digitalia

(informação recebida pela Origem da Comédia)
O Conselho Editorial dos Classica Digitalia – braço editorial do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da UC – tem o gosto de anunciar três novas publicações. Todos os volumes dos Classica Digitalia são editados em formato tradicional de papel e também na biblioteca digital. O eBook correspondente (cujo endereço direto é dado nesta mensagem) encontra-se disponível em acesso livre. O preço indicado diz respeito ao volume impresso. 

NOVIDADES EDITORAIS

Série “Humanitas Supplementum” (Estudos)
- José Augusto Ramos & Nuno Simões Rodrigues (coords.), Mnemosyne kai Sophia (Coimbra, Classica Digitalia/CECH/CHUL, 2012). 200 p.
Hiperligação: https://bdigital.sib.uc.pt/jspui/handle/123456789/134
PVP: 20 € / Estudantes: 16 € [capa dura]
- Ana Maria Guedes Ferreira, O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcmeónidas (Coimbra, Classica Digitalia/CECH, 2012). 396 p.
Hiperligação: https://bdigital.sib.uc.pt/jspui/handle/123456789/136
PVP: 30 € / Estudantes: 24 € [capa dura]

Série “Varia” (Estudos)
- M.ª Nieves Muñoz Martín & José A. Sánchez Marín (eds.), Homenaje a la Profesora María Luisa Picklesimer (In memoriam) (Coimbra, Classica Digitalia/CECH, 2012) 434 p.
Hiperligação: https://bdigital.sib.uc.pt/jspui/handle/123456789/135
PVP: 25 € / Estudantes: 20 €

sábado, 8 de dezembro de 2012

[FLUL] "Shakespearian Sophocles"



Fiona Macintosh
(University of Oxford)

12 de Dezembro de 2012 |
18h00 | FLUL Sala 2.13

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Uma leitura de Ésquilo

Roubo em Olímpia: Peças Recuperadas

Passaram nove meses desde que dois homens armados e de máscara entraram no Museu de Olímpia, um dos centros arqueológicos mais importantes da Grécia, e roubaram 77 artefactos em bronze, ouro, cobre e cerâmica. Agora, as autoridades de Atenas anunciaram ter apreendido os objectos roubados, na sua maioria pequenas esculturas de animais. Os contornos da operação, como quase sempre que se trata de tráfico de antiguidades, parecem saídos de um filme. 

A polícia prendeu três dos suspeitos na sexta-feira, num hotel da cidade de Patras, depois de um agente à paisana se ter feito passar por um potencial comprador. Um dos homens, que segundo a agência de notícias AFP acabou por divulgar a identidade dos seus cúmplices, tentou negociar a venda de um anel de ouro com 3200 anos: começou por pedir 1,5 milhões de euros e acabou por aceitar 300 mil. Os outros dois esperavam-no no átrio do hotel. Em seguida, a polícia recuperou os restantes artefactos, muitos com mais de três mil anos – estavam num saco e enterrados numa zona rural nos arredores da antiga cidade de Olímpia, a pouco mais de três quilómetros do museu. Entre eles há várias lucernas, vasos de cerâmica e estatuetas dos atletas que participavam nas corridas de cavalos e touros. 

Os ladrões já detidos são de nacionalidade grega, têm entre 36 e 50 anos e alguma experiência no tráfico de antiguidades. Dois deles são desempregados e o terceiro é um construtor civil de Patras. As autoridades, que estão ainda à procura de dois outros cúmplices, garantiram numa conferência de imprensa no sábado, em Atenas, que todos os artefactos roubados na manhã de 17 de Fevereiro foram recuperados. Mas a equipa do museu arqueológico da cidade onde nasceram os Jogos Olímpicos quer examinar cuidadosamente cada uma das peças para se certificar de que o conjunto está completo. Diz a BBC online que as peças deverão chegar ao museu durante esta semana. 

“Hoje é um dia extremamente importante e feliz para o Ministério da Cultura e a comunidade arqueológica”, afirmou no sábado a secretária-geral do Ministério da Educação, Cultura e Desporto, Lina Mendoni, citada pela agência Xinhua. “No meio de uma onda de publicidade negativa em relação à vida da Grécia e dos gregos, que já dura há dois anos, este é um momento luminoso. Estes objectos fazem parte da nossa história”, disse Maria Panagopoulou, habitante de uma aldeia próxima do estádio de Olímpia, à agência de notícia chinesa. “Com o roubo, sentimos que parte do nosso coração tinha desaparecido. Agora está outra vez no lugar.”

O roubo no Museu de Olímpia, o primeiro desde que abriu no edifício onde hoje se encontra, em 1982, foi imediatamente ligado à crise que a Grécia atravessa. Os cortes orçamentais no Ministério da Cultura têm levado a despedimentos de guardas e vigilantes de museus e sítios arqueológicos um pouco por todo o país. Quando os ladrões entraram no museu arqueológico, apenas uma segurança estava a trabalhar e não foi difícil amarrá-la, apesar de ter oferecido resistência, disseram na altura as autoridades locais. O roubo em Olímpia foi particularmente embaraçoso para o governo de Atenas porque aconteceu apenas um mês depois de a Galeria Nacional de Arte, na capital, ter sido assaltada – foram levadas duas pinturas, uma de Picasso e outra de Mondrian. Perante as críticas à falta de segurança no património grego, o ministro da Cultura, Pavlos Geroulanos, pediu a demissão, que não foi aceite. 

No sábado, o governo procurou tirar dividendos da operação policial que levou à detenção dos assaltantes de Olímpia. O ministro Nikos Dendias garantiu: “Mesmo no mais difícil dos cenários nós não comprometemos a segurança nem a protecção do nosso património.” O Mondrian e o Picasso ainda não foram recuperados.

notícia retirada daqui.

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Insulae Accipitrinae

O novo secretário regional da Educação e Formação dos Açores, Luiz Fagundes Duarte, anunciou esta quarta-feira a intenção de introduzir as disciplinas de latim e grego clássico nas escolas, a título de opção. O governante, que falava na apresentação do programa do Governo para os próximos quatro anos, que está em discussão no plenário da Assembleia Legislativa dos Açores, na cidade da Horta, entende que é necessário "reforçar a componente humanística" dos alunos. "Será incentivada a reintrodução gradual, e de acordo com as disponibilidades de docentes e com os projetos pedagógicos das escolas, da disciplina de Latim e mesmo do Grego clássico, em regime de opção", sublinhou.

ler o resto da notícia aqui.

domingo, 25 de novembro de 2012

Aristófanes Fala

Quando Denis [Dionísio], de Siracusa, pediu a Platão documentos sobre a vida grega, colectiva e natural, recebeu minhas comédias e não as tragédias de Ésquilo, Sófocles, Eurípides. A Grécia estava ali, completa e viva, em tamanho real, nas dimensões dos vícios e das virtudes. Continuaram contemporâneas. Ainda comovem, irritam, enternecem. Fazem rir. E são apenas onze. Venceram mais de dois mil anos! [...] Outro elemento, desaparecido na maré-montante das convenções e restrições da Etiqueta presente, era a Linguagem usada pelos nossos atores e declamada pelo coro. Vibrava e agia inalterada e natural como se cada cidadão estivesse no palco. Não evitávamos vocábulos expressivos e menos ainda claras alusões às intimidades verídicas da vida doméstica. Mesmo que a concepção temática fosse alta e nova, como Nuvens, Rãs, Vespas, Pássaros, não empregávamos jamais dois vocabulários, como fazem os civilizados de agora, uma língua no palco e outra nas casas, ruas e praças, mercados e palácios, sendo realmente uma única. Vivíamos, verbalmente. A continuidade realística das vozes habituais. As nossas damas e matronas ouviam no palco o que sabiam existir nos costumes familiares. Apenas, nunca essa liberdade vocabular constituía o fundamento sedutor da peça. O nosso pudor tinha outros recatos e símbolos. As frases mais vivas caiam com naturalidade e no justo momento irrecusável. Por isso os tradutores, com moral ofendida e inocência ameaçada, fazem versão desses trechos do grego para o latim, ou avisam, anjos pulcros, que o período é intraduzível. Satanás reaceando brasas. Poseídon temendo afogar-se.

Câmara Cascudo, Prelúdio e Fuga do Real.
Fundação José Augusto, Natal: 1974, pp. 145-151.

sábado, 24 de novembro de 2012

Clássicos Subversivos


(cruzar com este post, a propósito do qual ler, já agora, este)
Metaxas [o ditador grego do Regime do 4 de Agosto (1936-41)] had been promoting ancient drama in the form of mass open-air spectacles, and he had received the public endorsement of writers such as Yeorgios Theotokas, a politically moderate intellectual, and others with more onservative political agendas who stressed the value of classical literature. Under Metaxas, too, the chauvinist presumption grew that revivals of classical tragedy had to uphold this treasured legacy of Greece's national, 'monumental' poetry. Metaxas further subjected theatre to state censorship and control of thought. He tried to ban, in particular, a National Theatre production of Sophocles' Antigone, because the heroine proclaimed disobedience to the self-serving laws of tyranny. Unable to cancel te scheduled performances, the government had certain 'inappropriate' lines cut from the script (Hamlakis 2007: 178; Van Steen 2001: 141). [n. 14]

[nota 14:] Metaxas also excluded the famous Funeral Oration of Pericles from school readings of Thucydides' History of the Peloponnesian War (2.34-47). The dictator did not want the new Hellenic generation to be brought up with the ideals of freedom and democracy as expounded by the ancient Greeks:
In the teaching of ancient Greek in the 6th High School grade, omit the funeral oration of Pericles, substituting this with some Platonic dialogue, because the funeral oration, truthfully grand of democratic ideas, may be misunderstood by the students as indirect criticism of the vigorous governmental policy and, in general, of the trend of the present State... [T]here exists the probability that these pages will produce the same ruinous and disintegrating results that they did during the period of the Peloponnesian War, when they were recited to the unstable populace of Athens by the great Pericles, who presented so brilliantly the victories of democracy to the intellectually unprepared Athenian rabble... [excerto da directiva estatal da autoria de D. Papoulias mas em nome de Metaxas].  
Gonda Van Steen, Theatre of the Condemned. 
Classical Tragedy on Greek Prison Islands. Oxford 2011: 43-44.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O Cáucaso é no Egeu

mulheres em Trikeri
Even though the Prometheus production [na ilha de Trikeri, campo prisional a céu aberto para mulheres que haviam apoiado, directa ou indirectamente, os comunistas na Guerra Civil Grega] did not go beyond the dress rehearsal stage, the tragedy itself warrants a closer look in the light of its reception by the Greek Left, or of some of the older uses of the hero as symbol. Hariati-Sismani [uma das prisioneiras que colaborou na peça] left no doubt as to how she and her fellow inmates read Prometheus' character and condition:
For us, Prometheus was he who does not sign a 'declaration' [of repentance], who accepts to stay nailed to his rock and to remain in his martyrdom, just like us, rather than yield to violence... Prometheus was us and all the words of the drama fit us like a glove. We called Hermes 'the errand boy'. Hephaestus was the worker who forges his own bounds. And Oceanus? That was my uncle, who had written to me, a few days earlier, to urge me to repent. (1975: 24).
Hariati-Sismani had intentionally dressed the Prometheus of the play in a deep red chiton (1975: 25). This 'red' Prometheus did not succomb to the pressure to sign a 'declaration of repentance'. [...] Sucessive Greek right-wing governments coaxed or terrorized political prisoners into signing a recantation or renunciation of their ideological beliefs, called a dílosi metanoías [δήλωση μετανοίας]; or, short, a dílosi. [...] Many detainees, especially on Makronisos, caved in under psychic and/or bodily torture to sign such a declaration and became 'dilosíes', which often opened up a whole new set of requirements: from composing hideous confession statements to denouncing their former comrades, to assisting in the process of 'breaking' others (to translate the modern Greek expression for 'torturing').

Gonda Van Steen, Theatre of the Condemned. 
Classical Tragedy on Greek Prison Islands. Oxford 2011: 119-120.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Glosae

For all that has been said since the 1960s  with special and especially democratic dedication to the reader's  freedom    about  multiple  meanings  as  a  potential  of  any  individual  text  and  about interpretation  as  a  never-ending  task,  for  all  those  very  sophisticated  and  sometimes  overly  complicated pictures of the act of interpretation, I think that in our everyday practice we take interpretation as a task that can and normally will be brought to a conclusion. We expect that, in the average case of an interpretation, there will be a moment when we know that we have understood  the  text  or  other  artifact,  and  we  normally  associate  understanding  with  the impression  that  we  now  know  what  the  author  wanted  this  text  to  mean  or  be. 

This assumption  about  the  normally  finite  character  of  interpretation,  I  believe,  explains  its triumphant career as a core exercise for homework assignments and written tests in secondary education.  Commentary,  in  contrast,  appears  to  be  a  discourse  that,  almost  by  definition, never reaches its end. Whereas an interpreter cannot help extrapolating an author-subject as a point of reference of his or her interpretation (and cannot help giving shape to this reference as the interpretation progresses), a commentator is never sure of the needs (i.e., the lacunae in the  knowledge)  of  those  who  will  use  the  commentary.

However  carefully  you  cater  to  the needs  of  your  contemporaries  among  the  potential  readers  of  a  text  in  question,  you  can never anticipate exactly what will have to be explained for readers of the next generation, and it  is  mainly  this  condition  that  makes  commentary  a  constitutively  unfinished  exercise  and discourse.  Not  surprisingly,  then,  the  history  of  the  word commentary yields  too  many different meanings  and therefore too vague a meaning  to suggest a more precise definition. 

And does this general flavor of vagueness not go together with an impression that users of commentaries almost always have, namely (and to exaggerate only slightly), that any given commentary offers all kinds of interesting bits and pieces of knowledge but hardly ever  that  one  piece  of  information  that  you  needed and  whose  need  made  you  consult  the commentary in the first place?

Hans Ulrich Gumbrecht. The Powers of Philology. University of Illinois Press (2003).

[Brasília] XIX Congresso Nacional de Estudos Clássicos


Associação Portuguesa de Estudos Clássicos tem o gosto de divulgar o XIX Congresso de Estudos Clássicos, tendo como anfitrião e entidade organizadora a nossa congénere, Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos (SBEC) , a realizar na 2ª semana do mês de Julho de 2013.

A APEC não pode deixar de se congratular por esta iniciativa, pioneira em termos organizativos, congregando uma efectiva participação de instituições nacionais, do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos e da Associação Portuguesa de Estudos Clássicos, ocasião também de consolidação dos laços entre a comunidade lusófona dos Estudos Clássicos que tem vindo a ser construída em torno de projectos de docência e de investigação, com um intenso intercâmbio de estudantes.

Pesem os tempos mais agrestes vividos no nosso país, convidamos os estudiosos, profissionais e amantes dos Estudos Clássicos e do Mundo Antigo a seguirem de perto a organização deste evento (ver página web www.sbec2013.org) e a aproveitarem o nosso Verão para programarem uma deslocação a Brasília na data prevista, seja enquanto participantes activos dos painéis de comunicantes, seja enquanto assistentes.

Mediante a manifestação dos interessados comunicada à APEC (apecclassicos@gmail.com) , e atingido um determinado número, a APEC pode auxiliar na negociação, com uma agência de viagens, de um pacote de viagem e estadia mais atrativo para os que pretenderem associar-se.

Cordialmente,
A Direção da APEC
Paula Barata Dias
 
--//--

 
A Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos (SBEC) anuncia a realização de seu XIX Congresso Nacional de Estudos Clássicos na cidade de Brasília, de 8 a 12 de Julho de 2013, com o tema "O futuro do passado".

Informações sobre modalidades de apresentação de trabalhos estão disponíveis no website do evento: www.sbec2013.org

O prazo final para inscrição de trabalhos é 15 de fevereiro de 2013.

A SBEC firmou no evento uma parceria científica com a sociedade-irmã Associação Portuguesa de Estudos Clássicos (APEC), acrescentando assim ao seu XIX Congresso Nacional a nomenclatura de I Simpósio Luso-brasileiro de Estudos Clássicos.

Esperamos vê-los em breve em Brasília!
Gabriele Cornelli

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

'Édipo', de Séneca, na Artefacto


ÉDIPO, de Séneca
tradução de Ricardo Duarte

apresentação por Cristina Pimentel e Cláudia Teixeira

19 de Novembro 2012
Faculdade de Letras, Universidade de Lisboa
Anfiteatro 2 - 17h

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Novidades Editoriais dos Classica Digitalia

(informação recebida pela Origem da Comédia)
O Conselho Editorial dos Classica Digitalia – braço editorial do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da UC – tem o gosto de anunciar duas novas publicações, uma das quais em parceria com a Imprensa da Universidade de Coimbra. Todos os volumes dos Classica Digitalia são editados em formato tradicional de papel e também na biblioteca digital. O eBook correspondente encontra-se disponível em acesso livre. O preço indicado diz respeito ao volume impresso. 

NOVIDADES EDITORAIS 

I. Série “Humanitas Supplementum” (Estudos) 

- José Ribeiro Ferreira, Delfim F. Leão, & Carlos A. Martins de Jesus (eds.): Nomos, Kosmos & Dike in Plutarch (Coimbra, Classica Digitalia/CECH, 2012). 277 p. 
PVP: 25 € / Estudantes: 20 € [capa dura] 

II. Série “Varia” (Estudos)

- Delfim F. Leão, A globalização no mundo antigo. Do polites ao kosmopolites (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra / Classica Digitalia). 158 p. 
PVP: 11 € / Estudantes: 9 €

L'Anée Philologique

Agradecemos à Professora Paula Barata Dias o ter-nos feito chegar esta notícia. 

No ano passado a Anée Philologique denunciou o encerramento iminente da sua ala de publicação alemã. Prontamente houve quem falasse contra e alto. Dizem-nos agora que a angariação de 4500 assinaturas para a salvaguarda duma revista académica, aliás, para a salvaguarda duma ala duma revista académica, não poderia jamais ser tomada como de pequena monta; terá assim sido um factor de peso se não mesmo a pedra angular na manutenção perseverante da revista. A Anée Philologique alemã não se extinguirá, em vez disso será transplantada com mudança integral de equipa para a alçada da Universidade de Munique. Referem hoje à comunidade académica termos de agradecimento e de júbilo, que nós do mesmo modo acolhemos. Mais informações.
Cher(e)s collègues  et ami(e)s, Merci à tous. 
Vous êtes près de 4500 à avoir signé notre pétition de solidarité envers la rédaction allemande de l’Année Philologique (APh) depuis sa mise en ligne en avril dernier. Vous venez des quatre coins du monde, d’horizons, métiers et spécialités très différents. Vous n’êtes pas tous antiquisants, ce qui prouve le rayonnement de l’APh au delà de nos domaines spécialisés et son ancrage dans le monde de l’université et de la recherche en général. Plusieurs d’entre vous ne sont pas directement membres de la communauté académique. Parmi vous, de nombreux étudiants, ce qui est encourageant pour l’avenir : leur soutien prouve l’utilité de notre travail pour le développement des études classiques et pour la diffusion de l’information scientifique. Vos commentaires nous encouragent à poursuivre, mais ils soulignent aussi la grande responsabilité qui est la nôtre face à vos exigences de qualité et de pertinence scientifique. Vous êtes nombreux à souligner l’importance d’une bibliographie comme l’APh, sous tutelle d’institutions publiques universitaires et de recherche, à un moment où l’information scientifique tend à devenir un enjeu commercial. Votre mobilisation a permis à nos collègues allemands de continuer à travailler sans se décourager, dans des conditions de grande incertitude. Votre soutien rapide et massif a sans doute pesé dans la recherche de solution de la part des autorités académiques allemandes. Nous vous sommes tous reconnaissants. 

Des nouvelles de la situation actuelle. Une nouvelle rédaction de l’Année Philologique a été créée sous la tutelle de l’université de Munich. Elle prendra en janvier 2013 la suite de la Zweigstelle Heidelberg qui fermera ses portes fin décembre 2012. La disparition définitive de la partie allemande et de la langue allemande de l’APh a ainsi été évitée. Cette rédaction aura un financement pour trois ans et comportera moins de personnel que la précédente. Des procédures de transmission du savoir et des compétences de l’ancienne rédaction à la nouvelle sont en cours d’élaboration, dans le respect du cahier de charges dont la direction scientifique de l’APh a la responsabilité et qui a été envoyé à la nouvelle tutelle. Cette transmission est indispensable, car la nouvelle rédaction sera constituée de collègues entièrement nouveaux. 

Nous souhaitons que la nouvelle rédaction soit pérennisée et qu’elle ait les moyens d’accomplir sa tâche de la meilleure façon possible. Elle aura en tout cas notre appui comme toutes les rédactions. Nous vous tiendrons informés des évolutions à venir, mais nous comptons aussi sur votre vigilance. Grâce aux efforts de tous, l’APh continuera à avoir un rôle central dans le paysage scientifique au niveau international. 

Encore merci et à bientôt.
L’équipe éditoriale parisienne.
Dina Bacalexi, Julie Giovacchini (directrices)
Laurent Capron, Sébastien Grignon (éditeurs)

domingo, 28 de outubro de 2012


"Coisas belas talvez no seu modo de entender o mundo pela beleza que é talvez bela mas não é esta a minha hora de a aprender. (...)
Agora quero olhar-te no fresco de Pompeia, se não te aborreces. Está aqui numa parede do meu quarto (...) Eles que esperem todos, tenho tanto que estar só contigo. Com a tua imagem fictícia da minha idealidade vã. (...) - olho o fresco de Pompeia. Ou não bem de Pompeia, mas de Estábias que fica logo a seguir e ao Sul. Ou talvez não de Pompeia mas Pompeios que é um nome feio como um tombone (trombone?). Representa a Primavera, o fresco. Ou talvez a deusa Flora para ser mais corpórea contigo. Mas é um corpo transcendente até à sublimidade. Tu tinhas mais peso do que isso, querida. Mas eu preciso agora tanto de seres divina. Transcendente irreal. Dissolúvel e vã - deixa-me ser infantil. Mesmo o amor só começa a existir assim, é dos livros. Metafísico disparatado. Abaixo disso tem já outro nome que vem na fisiologia. Preciso ardentemente de irradiar o teu corpo a tudo quanto baste para ser divino. (...)
É uma deusa linda num instante do seu movimento leve, mas não se lhe vê a face. Porque a beleza não é dela mas da leveza do seu passar. (...)
E o imponderável de todo o seu ser de passagem. Mas era o que sobretudo eu gostaria de te dizer desta deusa grave e aérea. Não bem o seu corpo esbelto como um voo de ave, mas só esse voo. Não bem a sua juventude eterna mas a eternidade. Não o gracioso dela mas a graça. Olho-a infinitamente para tu lá estares e ouço-te rir porque não estarias nunca. Fito-o e filtro-o para ficar comigo o seu impossível até à morte. (...)
Olho-a ainda, olho-a sempre. Passa aérea e de costas. E assim a sua beleza é invisível, no anúncio do que jamais poderemos ver. Assim a sua beleza é a mais bela porque está perto e longe, na realidade tangível e intocável para sempre. Na face oblíqua de que jamais saberemos a face. No olhar que inunda todo o corpo como é próprio de todo o olhar mas de que jamais saberemos os olhos donde vem a torrente. No seu corpo de deusa e no enleio do seu movimento que jamais poderemos ter nas mãos porque a sua realidade é o passar. (...) Tenho de deixar de olhar esta deusa efémera no breve instante de ser deusa (...)
Mas tanto como me custa. Deixo de a olhar e ela passa, quando voltarei a vê-la?"

Vergílio Ferreira, Em nome da terra, Quetzal Editores, 2009, pp.113-114


Plato's Dialogues

Uma série de artigos no Guardian em jeito de introdução a Platão e aos diálogos. (Nota: a série maior em que esta se encontra inserida, How To Believe, tem outras tantas sobre filosofia & religião, algumas francamente interessantes).

Lexica Latina et Graeca

O público para a seguinte partilha será por necessidade algo reduzido, mas há quem tenha sofrido bastante com a inexistência dum qualquer dicionário ou programa substituto que fosse capaz de encontrar instantaneamente os paralelos latim-grego/grego-latim sem passar pelas meias-vias de dicionários vernáculos. Recentemente passaram-me a ligação da seguinte ligação, onde estão disponíveis os famosos dicionários Latinum-Graecum Hedericus e o Schrevelius (as referências do género, e ainda passíveis de ser encontradas em mercados de segunda-mão), de modo semelhante à utilíssima adaptação do dicionário Inglês-Grego Woodhouse. Vai a negrito para os marcadores.


sábado, 27 de outubro de 2012

Studia Humaniora

We have here a theory upon which the concept of humanitas is based, a concept that is often considered typically Roman rather than Greek. It is expressed in the famous saying of Terence: "I a a man: I consider nothing human to be foreign to me." And here we may also remember a famous passage of [Aulus] Gellius in which the two meanings of the Latin concept of humanitas are discussed. One is defined as benevolence toward all men and corresponds to the Greek concept of philanthropia (which is hence the source of the Latin humanitas). The other meaning deals with education in the human or liberal arts and corresponds to the Greek term paideia. Gellius, who emphasizes the second meaning of humanitas and treats the first nearly with scorn, does indicate that also the first one is derived from the Greek. I am inclined to think that the Terentian and Ciceronian concept of humanitas reflects a concept of Panaetius. The ambiguity of the term and the confusion of the two meaninsg were used by the humanists to give a moralistic and humanitarian color to what was their cultural ideal. In the hands of our contemporaries it has served to substitute for the culture of humanism a brand of sentimental philanthropy that is about to deprive humanistic culture of its traditional place in the schools and universities and to take over the institutions and resources originally established for it.

Paul Kristeller. Greek Philosophers of the Hellenistic Age. Columbia University Press (1993).