domingo, 17 de outubro de 2010

XIII

Ouves, amada, a alegre gritaria vinda da Via Flamínia?
São ceifeiros, regressam de novo a suas casas,
Longe daqui. Concluíram a colheita para o Romano,
Que não se baixa sequer para tecer uma coroa de flores para Ceres.
Já não se dedicam festas à grande Deusa
Que não dava bolotas como alimento, mas o trigo doirado.
Celebremos aqui em silêncio e alegria a nossa festa:
Dois seres que se amam muito, em vez do povo reunido.
Alguma vez ouviste falar daquela cerimónia mística
Que outrora acompanhava o vencedor de Elêusis até aqui?
Os Gregos criaram-na, e mesmo entre os muros de Roma
Só os Gregos chamavam sempre: «Venham à noite sagrada!»
E então fugia o profano, e à espera tremia o noviço
Que um hábito branco, símbolo de inocência, envolvia.
Assombrosos círculos de figuras estranhas
Confundiam o iniciado como se num sonho flutuasse, pois
No santuário serpenteavam cobras e moças passavam,
Coroadas de flores e espigas, trazendo nas mãos cofres fechados.
Com gestos ambíguos os sacerdotes sussuravam,
Impaciente e receoso o aprendiz ansiava por luz.
Só após muitas provas, voltando muitas vezes, ele soube
O que o círculo sagrado ocultava em estranhas imagens.
E qual era o segredo? Que também a grande Deméter
De bom grado se deitou um dia de costas
Quando cedeu ao nobre Iásion, o vigoroso rei dos Cretenses,
O doce segredo do seu corpo imortal.
Como se regozijou Creta, pois o leito nupcial da Deusa
Estava repleto de espigas e o campo pejado de trigo.
Mas o resto do mundo passava fome, pois no deleite
Do amor Ceres faltava ao seu belo ofício.
Cheio de espanto o iniciado ouviu a lenda,
Fez sinal à amada — Entendes tu agora, amor, o sinal?
Segue-me depressa até ao canavial no fundo da vinha,
O nosso prazer não traz perigo ao mundo.

Goethe, Erotica Romana
Cavalo de Ferro, Lisboa: 2005. (trad.: Manuel Malzbender)

[Hörest du, Liebchen, das muntre Geschrei den Flaminischen Weg her?
Schnitter sind es; sie ziehn wieder nach Hause zurück,
Weit hinweg. Sie haben des Römers Ernte vollendet,
Der für Ceres den Kranz selber zu flechten verschmäht.
Keine Feste sind mehr der großen Göttin gewidmet,
Die, statt Eicheln, zur Kost goldenen Weizen verlieh.
Laß uns beide das Fest im stillen freudig begehen!
Sind zwei Liebende doch sich ein versammeltes Volk.
Hast du wohl je gehört von jener mystischen Feier,
Die von Eleusis hieher frühe dem Sieger gefolgt?
Griechen stifteten sie, und immer riefen nur Griechen,
Selbst in den Mauern Roms: »Kommt zur geheiligten Nacht!«
Fern entwich der Profane; da bebte der wartende Neuling,
Den ein weißes Gewand, Zeichen der Reinheit, umgab.
Wunderlich irrte darauf der Eingeführte durch Kreise
Seltner Gestalten; im Traum schien er zu wallen: denn hier
Wanden sich Schlangen am Boden umher, verschlossene Kästchen,
Reich mit Ähren umkränzt, trugen hier Mädchen vorbei,
Vielbedeutend gebärdeten sich die Priester und summten;
Ungeduldig und bang harrte der Lehrling auf Licht.
Erst nach mancherlei Proben und Prüfungen ward ihm enthüllt
Was der geheiligte Kreis seltsam in Bildern verbarg.
Und was war das Geheimnis! als daß; Demeter, die große,
Sich gefällig einmal auch einem Helden bequemt,
Als sie Jasion einst, dem rüstigen König der Kreter,
Ihres unsterblichen Leibs holdes Verborgne gegönnt.
Da war Kreta beglückt! das Hochzeitbette der Göttin
Schwoll von Ähren, und reich drückte den Acker die Saat.
Aber die übrige Welt verschmachtete; denn es versäumte
Aber der Liebe Genuß Ceres den schönen Beruf.
Voll Erstaunen vernahm der Eingeweihte das Märchen,
Winkte der Liebsten - Verstehst du nun, Geliebte, den Wink?
Jene buschige Myrte beschattet ein heiliges Plätzchen!
Unsre Zufriedenheit bringt keine Gefährde der Welt.]

imagem: Temple of Ceres at Eleusis, de Joseph Gandy (1818)

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