terça-feira, 5 de julho de 2011

Centauros



O vivificante

Aquela que subjuga os homens, depois
De a terem conhecido, os Centauros,
A violência
Do vinho doce como mel, bruscamente afastaram de si
O branco leite com as mãos, a mesa, por si mesmos,
E dos chifres de prata bebendo
Deixaram-se inebriar.

O conceito dos Centauros é decerto o do espírito de um rio, na medida em que abre o curso e o limite, pela força, na terra originariamente liberta de atalhos que cresce para o alto.

A sua imagem encontra-se assim em pontos da natureza em que a costa é fértil em rochedos e grutas, particularmente em lugares onde na sua origem o rio era forçado a abandonar a cadeia das montanhas e a rasgar transversalmente o seu rumo.

Os Centauros são por isso também na origem mestres na ciência da natureza, pois é a partir desse ponto de vista que se torna possível perscrutar a natureza com a maior precisão.

Em tais regiões, o rio tinha na origem de se perder, antes de poder trilhar o seu caminho. Assim se formaram, como junto aos lagos, planícies húmidas e cavidades na terra para os mamíferos, e o centauro era então um pastor selvagem, semelhante ao Ciclope da Odisseia; as águas buscavam ansiosamente o seu rumo. Porém, à medida que de ambas as suas margens a mais seca se formava com maior firmeza, e ganhava direcção através das árvores solidamente enraizadas, e dos arbustos da videira, mais o rio, que extraía o seu movimento do vulto da margem, era também obrigado a assumir uma direcção, até que, impelido a partir da sua origem, se rompia num ponto em que as montanhas, que o encerravam, se ligavam da forma mais leve possível entre si.

Foi assim que os Centauros aprenderam o poder do vinho doce como mel, receberam movimento e direcção da margem solidamente formada, repleta de árvores, e rejeitaram com as mãos o branco leite e a mesa, a vaga moldada rechaçou a tranquilidade do lago, também as formas de vida na margem se modificaram, o assalto da floresta, com as tempestades e os seguros príncipes dos bosques, agitou a vida ociosa da charneca, a margem mais escarpada fez recuar as águas estagnadas por longo tempo, por si próprias bebendo dos chifres de prata, traçaram o seu curso, assumiram um destino.

Os cantos de Ossian, em particular, são verdadeiros cantos de Centauro, cantados com o espírito do rio, e como que pelo grego Quíron, que instruiu também Aquiles na arte da lira.


Hölderlin. Fragmentos de Píndaro. Bruno C. Duarte (trad). A&A: 2009

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