" 'Tendo rido Deus, nasceram os sete deuses que governam o mundo... Quando ele gargalhou, fez-se a luz... Ele gargalhou pela segunda vez: tudo era água. Na terceira gargalhada, apareceu Hermes; na quarta, a geração; na quinta, o destino; na sexta, o tempo.' Depois, pouco antes do sétimo riso, Deus inspira profundamente, mas ele ri tanto que chora, e de suas lágrimas nasce a alma.
Assim se exprime o autor anônimo do papiro alquímico que data do seculo III, o papiro de Leyde. O universo nasceu de uma enorme gargalhada. Deus, o Único, qualquer que seja seu nome, é acometido -não se sabe por que- de uma crise de riso louco, como se, de repente, ele tivesse consciência do absurdo de sua existência. Nessa versão da criação, Deus não cria pela palavra, que já é civilização, mas por esse evocar de vida selvagem, e cada um de seus sete acessos faz surgir do Nada um novo absurdo, tão absurdo quanto o próprio Deus: a luz, a água, a matéria, o espírito. E, no final desse big bang cômico e cósmico, Deus e o universo encontram-se em um face a face eterno, perguntando-se um ao outro o que estão fazendo lá: aquele que ri e sua gargalhada."
MINOIS, Georges. História do riso e do escárnio. Sao Paulo: Editora UNESP, 2003, p.21,22.
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