domingo, 29 de setembro de 2013

[Hölderlin] Natureza e Arte, ou Saturno e Júpiter



Reges o dia nas alturas e floresce a tua
    Lei. És tu quem segura a balança, filho de Saturno!,
        Quem reparte a Sorte e descansa feliz no
            Descanso das imortais artes do poder.

Mas dizem entre si os poetas que em tempos
    Confinaste ao abismo o pai sagrado, o teu pai,
         E que nas profundezas ele se lamenta por estar
            Junto dos selvagens de antes de ti que justamente lá jazem.

O Deus da idade do ouro jamais teve culpa alguma.
    Ele que foi em tempos descansado e grande como tu
        Quando não tinha que enunciar nenhuma ordem
            Nem nenhum dos mortais o chamava pelo nome.

Já cá para baixo! ou então não te envergonhes de estar grato!
    E se insistes em ficar, serve o mais Antigo,
        E concede que seja a ele que os poetas nomeiem
            Antes dos demais Deuses e Homens .

Porque como das Nuvens teu Relâmpago, assim também dele
    Vem aquilo que é teu: é dele que as tuas ordens
        Dão testemunho, e é da Paz de Saturno
            Que tem todo o poder sua origem.

E quando finalmente o meu coração
    Sentir o Vivo, e quando o que tu violentaste entardecer,
        Quando me adormecer placidamente
            No berço o alternável tempo,

Só então te conhecerei, Krónida. Só então te ouvirei,
    Sábio Mestre. Tu que és como nós um Filho
        Do Tempo ao dares a Lei e ao anunciares
            Aquilo que esconde o santo crepúsculo .


Friedrich Hölderlin. Natur und Kunst, oder Saturn und Jupiter.
Tradução minha.


Du waltest hoch am Tag und es blühet dein
    Gesetz, du hältst die Waage, Saturnus Sohn!
        Und teilst die Los' und ruhest froh im
            Ruhm der unsterblichen Herrscherkünste.

Doch in den Abgrund, sagen die Sänger sich,
    Habst du den heilgen Vater, den eignen, einst
        Verwiesen und es jammre drunten,
            Da, wo die Wilden vor dir mit Recht sind,

Schuldlos der Gott der goldenen Zeit schon längst:
    Einst mühelos, und größer wie du, wenn schon
        Er kein Gebot aussprach und ihn der
            Sterblichen keiner mit Namen nannte.

Herab denn! oder schäme des Danks dich nicht!
    Und willst du bleiben, diene dem Älteren,
        Und gönn es ihm, daß ihn vor Allen,
            Götter und Menschen, der Sänger nenne!

Denn, wie aus dem Gewölke dein Blitz, so kömmt
    Von ihm, was dein ist, siehe! so zeugt von ihm,
        Was du gebeutst, und aus Saturnus
            Frieden ist jegliche Macht erwachsen.

Und hab ich erst am Herzen Lebendiges
    Gefühlt und dämmert, was du gestaltetest,
        Und war in ihrer Wiege mir in
            Wonne die wechselnde Zeit entschlummert:

Dann kenn ich dich, Kronion! dann hör ich dich,
    Den weisen Meister, welcher, wie wir, ein Sohn
        Der Zeit, Gesetze gibt und, was die
            Heilige Dämmerung birgt, verkündet.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Projecto PI à procura de voluntários!

Correcção: É às 16h00 do mesmo dia.


O projecto com maior continuidade dentro da Origem tem sido o Projecto PI - Pequena Infância, que parte este ano para a sua quarta (!) edição. O objectivo é dar a conhecer os mitos clássicos às crianças de IPSS, centros de acolhimento e hospitais da cidade através do teatro, com um modelo próprio de sessões que envolve activamente os miúdos. É um projecto que tem tido bastante sucesso e que começa agora inclusive a disponibilizar para reflexão académica os resultados da sua experiência continuada (depois da apresentação do projecto em Paris, segue-se agora uma participação num colóquio em Oxford).

A próxima reunião do projecto, aberta a todos os curiosos e interessados em se juntar, será no dia 1 de Outubro, terça-feira, pelas 16h00, no Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Contamos com a vossa presença!

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Quando a arte grega perdeu as cores

A esmagadora maioria da escultura e arquitectura grega era pintada a corres garrigas que foram quase completamente perdidas com o desgaste do tempo. A hierarquização do branco face ao variegado que daí resultou teve um profundo impacto na História da Arte e na noção de belo da cultura ocidental. Este é um elegante e urgente artigo sobre a história desse gigantesco mal-entendido.



A Irrepetível Inspiração de Rafael

Take another of Raphael's personifications, Poetry [Imagem 1], or better still his ravishing drawing for that figure [Imagem 2]. From one point of view it is a pictorial sign with the obvious and enumerable attributes of the wings, the lyre and the book. But this vision not only signifies Numine afflatur [Inspiração Divina], it also displays or expresses it. The sign limits are blurred. The upturned gaze may still be a conventional sign for inspiration, carried by the tradition of art from ancient times, but the tense beauty of the figure is Raphael's own, and not even he could quite transfer and repeat it, for it may well be that the finished image is a little less convincing as an embodiment of the Divine afflatus though it has an added wreath.

     

E. GombrichSymbolic Images: Studies in the art of the renaissance. Phaidon (1977).

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Encerramento da Universidade de Athenas

Mais uma para as incontáveis penas da Héllade. Esta, se sequer nos é permitido dizê-lo, particularmente dolorosa: A Universidade de Athenas suspende todas as suas actividades, visto que se tornou impossível funcionar devido aos despedimentos em massa. Vou-me lembrando que o Imperador Justiniano já tinha obrigado a algo semelhante em 529 AD.

domingo, 22 de setembro de 2013

Odysseia — Proémio

Ὀδυσσείας τὸ φροίμιον

Άνδρα μοι έννεπε, Μοῦσα, πολύτροπον, ὃς μάλα πολλὰ
πλάγχθη, επεὶ Τροίης ἱερὸν πτολίεθρον έπερσε·
πολλῶν δ' ανθρώπων ίδεν άστεα καὶ νόον έγνω,
πολλὰ δ' ὅ γ' εν πόντῳ πάθεν άλγεα ὃν κατὰ θυμόν,
αρνύμενος ἥν τε ψυχὴν καὶ νόστον ἑταίρων.
αλλ' ουδ' ὧς ἑτάρους ερρύσατο, ἱέμενός περ·
αυτῶν γὰρ σφετέρῃσιν ατασθαλίῃσιν όλοντο,
νήπιοι, οἳ κατὰ βοῦς Ὑπερίονος Ηελίοιο
ήσθιον· αυτὰρ ὁ τοῖσιν αφείλετο νόστιμον ῆμαρ.
τῶν ἁμόθεν γε, θεά, θύγατερ Διός, ειπὲ καὶ ἡμῖν.

Fala-me, Musa, do homem astuto que tanto vagueou,
depois que de Tróia destrui a cidadela sagrada.
Muitos foram os povos cujas cidades observou,
cujos espíritos conheceu; e foram muitos no mar
os sofrimentos por que passou para salvar a vida,
para conseguir o retorno dos companheiros a suas casas.
Mas a eles, embora o quisesse, não logrou salvar.
Não, pereceram devido à sua loucura,
insensatos, que devoraram o gado sagrado de Hiperíon,
o Sol – e assim lhes negou o deus o dia do retorno.
Destas coisas fala-nos agora, ó deusa, filha de Zeus.

Homero. Odisseia. I.1-11. Tradução de Frederico Lourenço.

School Latin project lands European language award


Mais uma vez, desta vez de Inglaterra, nos chegam notícias de como um reestabelecimento do ensino das línguas clássicas não tem necessariamente que passar pelo aparto estatal. São boas notícias, especialmente porque, ao que me parece, revela que o ensino do Latim está a ser repensado a par do ensino das outras línguas, deixando para trás as bolorentas noções de que há uma categoria (línguas vivas) e outra (línguas mortas), cada qual com métodos diferentes — o que curiosamente leva a que as línguas vivas se aprendam as mortas não. Parabéns a toda a gente envolvida, pelo prémio e pela motivação.


sábado, 21 de setembro de 2013

Vergílio e a Prophecia


Quando chegaram à porta a jovem disse: «Chegou a hora
De interrogar o oráculo. O Deus! Eis o Deus!» Estava a meio da frase
Em frente à entrada quando de súbito a sua expressão e a sua cor
Se desfizeram e os cabelos se engrenharam. Respiração agitada.
O seu peito encheu-se de cólera feroz, e parecia maior do que era.
A voz não era já a duma mortal — e falou como quando a força
De Deus está por perto.

Vergilii Æneis [VI. 45-51]. Tradução minha.

Ventum erat ad limen, cum virgo 'Poscere fata
tempus' ait; 'deus ecce deus!' cui talia fanti
ante fores subito non vultus, non color unus,
non comptæ mansere comæ; sed pectus anhelum,
et rabie fera corda tument, maiorque videri
nec mortale sonans, adflata est numine quando
jam propiore dei.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

As Trindades do Pico della Mirandola


Aquele que entender profundamente com o seu intelecto como é que a divisão da Unidade de Vénus se articula com a Trindade das Graças, a Unidade do Destino com a Trindade das Parcas, e a Unidade de Saturno com a Trindade de Júpiter, Neptuno e Plutão, verá a maneira devida de proceder na theologia órphica. 

Pico della Mirandola. 900 Teses [39.8].
Tradução minha.

Qui profunde et intellectualiter divisionem unitatis Veneris in trinitatem Gratiarum, et unitatis fatalis, in trinitatem Parcarum, et unitatis Saturni in trinitatem Jovis, Neptuni et Plutonis intellexerit, videbit modum debitum procedendi in Orphica theologia.


Imagem: Cosimo Rosselli. Detalhe d'O Milagre do Sacramento com Marsilio Ficino, Pico Mirandulensis e Angelo Poliziano. @ Igreja de St. Ambrósio a Firenze.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Maravilhosa Justiça

a justiça é a melhor das virtudes,
nem a estrela vespertina nem a estrela matutina são tão maravilhosas quanto ela.

καὶ διὰ τοῦτο πολλάκις κρατίστη τῶν αρετῶν εῖναι δοκεῖ ἡ δικαιοσύνη
καὶ ούθ᾽ ἕσπερος ούθ᾽ ἑῷος οὕτω θαυμαστός


Aristóteles. Ethica Nicomachea V I. 1129b.
Tradução minha.

Gratias Sergio.

domingo, 1 de setembro de 2013

... Ancient without Modern, Modern without Ancient ...

 

[Gotthold Ephraim] Lessing had in his mind, as well as Latin and Greek, English, French and German always, Italian, even Spanish to some extent. And he read the Latin and the Greek in themselves — and with all due apparatus of technical scholarship considering his time. He was far from the twice- and thrice-garbled sciolism of the average French, and even English, critic of the late seventeenth and earlier eighteenth century, as from the arid pedantry of the Dutch and German scholars of the same date. To him, more perhaps than to any one else, it is due that modern criticism has not followed, more than it has done, the mere foolishness of the "modern" advocates in the Quarrel — that it has fortified itself with those sound and solid studies which antiquity alone can supply. For once more let it be said that if, from the pure critical point of view, Ancient without Modern is a stumbling-block, Modern without Ancient is foolishness utter and irremediable.

George Saintsbury, (1904) A History of Criticism and Literary Taste in Europe (vol.3) Aqui.