quinta-feira, 16 de maio de 2013

AULA


(um dos muitos poemas que a Origem tem na secção "Poemas roubados à Patrícia")

Nosso Profe. de latim, Mestre Aristeu, era magro
e do Piauí. Falou que estava cansado de genitivos
dativos, ablativos e de outras desinências. Gostaria
agora de escrever um livro. Usaria um idioma
de larvas incendiadas! Epa! o profe. falseou-ciciou
um colega. Idioma de larvas incendiadas! Mestre
Aristeu continuou: quisera uma linguagem que
obedecesse a desordem das falas infantis do que
das ordens gramaticais. Desfazer o normal há de
ser uma norma. Pois eu quisera modificar nosso
idioma com as minhas particularidades. Eu queria
só descobrir e não descrever. O imprevisto fosse
mais atraente do que o dejá visto. O desespero
fosse mais atraente do que a esperança. Epa! o
profe. desalterou de novo – outro colega nosso
denunciou. Porque o desespero é sempre o que não
se espera. Verbi gratia: um tropicão na pedra
ou uma sintaxe insólita. O que eu não gosto é
de uma palavra de tanque. Porque as palavras do
tanque são estagnadas, estanques, acostumadas.
E podem até pegar mofo. Quisera um idioma de larvas
incendiadas. Palavras que fossem de fontes e não
de tanques. E um pouco exaltado o nosso profe.
disse: Falo de poesia, meus queridos alunos. Poesia
é o mel das palavras! Eu sou um enxame! Epa!...
Nisso entra o diretor do Colégio que assistira
a aula de fora. Falou: Seo Enxame espere-me no
meu gabinete. O senhor está ensinando bobagens
aos nossos alunos. O nosso mestre foi saindo da
sala, meio rindo a chorar.

Manoel de Barros

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